Chegamos a San Carlos de Bariloche (90.000 habitantes, província de Rio Negro), via Buenos Aires, pela Aerolineas Argentinas. O Corsinha que havíamos alugado via internet nos esperava. Como pensávamos desfrutar de Bariloche na volta, enveredamos pela ruta 231 em direção de Villa Angostura, 84Km rumo norte. A paisagem era deslumbrante. Um céu azul, o verde dos bosques que desciam da cordilheira e o lago Nahuel Huapi nos acompanhavam.
Já em Villa Angostura, que recebe seu nome do istmo Angostura, da península de Quetrihué, nos hospedamos na Hosteria Amigos Del Bosque, com uma imponente vista para o lago, Baia Manzano. Fui seduzido pelo nome. Não me equivoquei. Um casal jovem de portenhos atendia com cordialidade e presteza. Sempre no primeiro dia, ainda atordoado pela viagem, me comporto como um turista inexperiente. Depois de escolher meu canto onde me instalar, e pensar com clareza, se me incorpora o espírito mochileiro. Agarro mapas, folders e averiguo as informações necessárias para descobrir aquele novo lugar.
La Angostura, como é chamada, é uma aldeia de montanha, com 12.000 habitantes. Lá se respira distinção e bom gosto. Um aluvião de colonos, boêmios e jovens se deslocaram para lá em busca de trabalho. Há uns dois anos iniciou o boom da construção. Detalhe: um estabelecimento não pode ter mais de 120 acomodações - não são massivos e existe muita restrição na construção (somente com pedra e madeira da região).
Pela beleza de suas paisagens, algumas celebridades elegeram esta aldeia como refúgio durante alguns meses ou em forma permanente.
As principais atrações são a estação de esqui Cerro Bayo, Mirador Belvedere, Bosque de Arrayanes, e uma visita ao Hotel Correntoso. O panorama desde a velha ponte de madeira sobre o pequeno rio Correntoso é emocionante. Um lugar ideal para os esportes náuticos é Puerto Manzano, com praias rodeadas de pinus, ciprestes e manzanos, e onde se encontram os alojamentos mais exclusivos da Villa. Os cursos de água que rodeiam La Angostura, na temporada de novembro a maio, são um deleite para os amantes da pesca de trutas.
Como estávamos a poucos quilômetros da fronteira (20Km), fomos via Paso Cardenal Samoré até ao Parque Nacional Puyehue com as Termas de Puyehue (45Km) e, no cume da montanha, o Centro Turístico de Antillanca (50Km´s), Hotel e Centro de Esqui. O Mirador, a 1.620mts de altitude, oferece uma espetacular panorâmica da região. Depois, relaxamos, imersos nas águas medicinais de Puyehue, com suas duas piscinas (sendo uma coberta). Usamos o resto do dia para colocar o roteiro em dia.
De volta a La Angostura, nos hospedamos na pequena e romântica Hosteria Epulen, com vista para o lago Correntoso e Cerro Bayo, a alguns metros da praia. Atendimento cálido e cordial das próprias donas: as portenhas Graciela e Maria Helena. O espírito mochileiro já se havia incorporado.
Depois de curtirmos bem La Angostura e de deliciar-nos com uma das especialidades da região, o cordeiro patagônico, fomos pelo Caminho dos Sete Lagos (Ruta 234) rumo ao norte, para San Martin de Los Andes. A distância é de 110Km´s. A estrada é de terra, mas bem conservada. Durante o trajeto acompanhamos os lagos Correntoso, Espejo, Espejo Chico, Villarino, Falkner, Hermoso, Machónico, Escondido e por último, quase chegando a San Martin, avistamos os reflexos azulados do belíssimo lago Lácar.
A localização de San Martin é privilegiada. Ela descansa em uma pequena enseada do lago Lácar. A vista desde a cordilheira é de cartão postal. Tem 25.000 habitantes e é o principal centro turístico da província de Neuquén.
Depois de conhecermos o Parque Lanin, com seu imponente vulcão de mesmo nome (3.776m), Lago Huechulafquen, Lago Meliquina e Villa Traful, voltamos pelas rutas 63 e 237 via Paso Córdoba, Confluência e rio Limay até Bariloche. A ambos lados do caminho uma mole de rochas de tom avermelhado, modeladas por ventos e chuvas, reproduzia uma paisagem lunar. Foi nesse lugar inóspito, às margens serenas do lago Meliquina, que incendiou nosso carro. Fomos salvos pelo espírito de solidariedade de uma família de argentinos que chegou no exato momento com seu extintor. Depois do susto fomos levados por nossos protetores ao único refúgio que havia pelas redondezas. A Agencia Correcaminos prontamente nos fez chegar outra viatura para retornarmos a Bariloche. Durante a espera, comemos uma deliciosa truta e compartimos a mesa com o único casal que se aventurava, como nós, por essas paragens. Era um casal de neonatologistas de Buenos Aires. Que mundo pequeno!
Chegando a San Carlos de Bariloche nos instalamos no Hotel Aconcagua, um três estrelas bem acessível e bem localizado. Visitamos o Cerro Catedral, um dos mais importantes centros de esportes de inverno e competições de esqui do continente; o Cerro Oto com sua confeitaria giratória; Cerro Campanário e o tradicional hotel Lao Lao, uma referência de luxo e bom gosto. Um passeio imperdível é a subida ao teleférico, considerada por experts como uma das mais belas vistas do planeta.
Deixamos para os últimos dias o Cruce de Lagos, um dos passeios mais interessantes de toda nossa viagem. A travessia inicia no Puerto Panuelo, através do Lago Nahuel Huapi, um dos mais belos da região. Navegamos uma hora e meia através de belas paisagens, chegando até Puerto Blest. Após pequeno trajeto de ônibus (6Km´s), embarcamos em outro catamarã para cruzar o bonito Lago Frias, com suas águas cor verde esmeralda, rodeado de penhascos e bosques virgens até Puerto Alegre. Cruzando a fronteira por Paso de Perez Rosales (1.022m) percorremos mais 23Km´s, até Peulla, nas margens do Lago Todos os Santos (Lago Esmeralda). Novo tramo de duas horas de catamarã até Petrohué.
O último percurso por terra contorna o Lago Llanquihue, chegando a Puerto Varas e Puerto Montt já no Oceâno Pacífico. Durante a travessia os imponentes cumes nevados do vulcão Tronador (3.491m) e Osorno (2.652m) nos espreitavam.
Um capítulo à parte, durante a travessia, é a homenagem que se presta a Perito Moreno (Francisco Pascacio Moreno), explorador, historiador e geógrafo portenho, que foi perito nas questões sobre limites entre Argentina e Chile. Suas cinzas foram esparsas a seu pedido, nessa ilha, Isla Centinela. Ao passar pela ilha, o comandante do barco, faz soar três vezes a sirene em homenagem a quem transformou e criou uma consciência ecológica em toda uma geração de jovens argentinos. Desde a Patagônia Norte até El Calafate, na província de Santa Cruz, onde estão os glaciares, impressiona ao viajante, essa nova forma de fazer turismo e ver o mundo. Ver, fotografar, preservar e manter intacto o meio ambiente. Foi a lição mais importante que nós aprendemos nesses escassos dez dias viajando pelo sul da Argentina.
A Patagônia Norte tem seu encanto em todas estações. O colorido dos bosques no outono, o atrativo da neve com seus centros de esqui no inverno e a possibilidade de um sem fim de trilhas e lagos nos ensolarados dias de verão. Como o tempo urge e outros destinos nos esperam, nos contentamos com o que vimos. Estávamos descobrindo as belezas da América. Ela estava ao nosso alcance. Eu senti orgulho de ser latino-americano.
Estado dos caminhos: pergunte sem timidez nos Postos ACA (Automovil Club Argentino) ou sintonize o rádio do seu carro em alguma das FM que transmitem várias vezes ao dia (por convenio com o Guia Verde), o estado atualizado dos caminhos.
As temperaturas médias no verão: mínima de 4, média de 18 e máxima de 27 graus. No inverno: mínima de –5, média de 6 e máxima de 14 graus.
Trecho percorrido: Puerto Panuelo, Lago Nahuel-Huapi, Puerto Blest, Puerto Alegre, Lago Frias, Puerto Frias, Paso Perez Rosales (aduana), Peulla, Lago Todos os Santos (Lago Encantado), Petrohué, Puerto Varas e Puerto Montt.
Horário das aduanas: de 8:00 às 19:00 horas.
Breve história deste circuito turístico: o Paso Perez Rosales foi descoberto pelos jesuítas. O primeiro cruze turístico foi em 1903.
Lista de atrativos (de norte a sul): Lago Lácar-Mirador del Arroyo Partido (a poucos quilômetros de San Martin. Um dos braços do arroio vai para o Pacifico e outro para o Atlântico). Lago de los Cangrejos ou Machónico (nome mapuche) é o primeiro lago a direita. Lago Villarino e Falkner (um de cada lado do caminho e unidos por um curto arroio). Lago Escondido (rodeado de bosques, o mais pequeno do passeio). Lago Correntoso (a 20Km de La Angostura). Lago Espejo (à mão direita). Lago Nahuel-Huapi, o maior e mais bonito.
Entre as alternativas que oferece o Corredor dos Lagos se encontra a Villa Traful, pela RN65, pequena aldeia de montanha, situada a 60Km´s de La Angostura. Vale a pena visitar o espetacular Mirador de los Vientos, penhasco rochoso de 70 metros de altura, com vista para as águas azuis do Lago Traful. É nessa região que Ted Tuner (o magnata americano das comunicações) comprou uma estância.
A subida ao Centro Turístico de Antillanca, na encosta do extinto vulcão Casablanca é de 14Km´s, desde Puyehue. O Hotel Antillanca oferece sauna, piscina climatizada e escola de esqui, aberta todo o ano.
Onde parar, aconselho: uma opção econômica e divertida para quem vai em grupo são las cabañas.